Dias atrás, enquanto eu entrava
em casa após retornar do trabalho, eu me deparei com uma cena da qual posso
dizer que não é muito comum de se ver na minha rotina de vida.
Minha mãe estava assentada no
sofá com a fisionomia um pouco abatida, como se estivesse chateada com algo.
Ela estava conversando com minha tia e ambas riam muito, mas mesmo assim foi
bem fácil notar um pouco de frustração no semblante dela, visto que minha Mãe
não é daquelas que se deixa abater por qualquer coisa.
Logo que minha tia se foi, ela
veio me perguntar se no meu guarda-roupas haviam algumas roupas de frio das
quais eu pudesse me desfazer, pois havia uma pessoa pra quem ela queria doá-las
– já é inverno; apesar do clima “tropical”,
só quem vive aqui em São Domingos do Prata sabe que a nossa cidade sempre teve
a fama de ser muito quente no verão e extremamente fria no inverno –. Eu
respondi que sim e que eu iria separar as roupas. Aproveitei para perguntar se estava
acontecendo alguma coisa, pois eu havia reparado que ela estava um pouco
abatida... E logo ela veio com uma história pra me contar...
Nesse mesmo dia, de manhã
cedinho, ela havia saído pra caminhar e durante o percurso, ela avistou uma
criança andando apressada, de mochila nas costas indo pra escola, calçando um par
de chinelos velhos, bem maiores que os pés, vestindo bermuda e uma camiseta um
pouco suja e rasgada, com os braços encolhidos e emaranhados pelo frio
latejante da manhã.
Quando se aproximou, ela a
reconheceu. Essa criança vive perto da nossa casa junto com a família; é uma
família carente, mas muito bondosa. São todos muito simples e também são gente muito
honesta.
Então, minha Mãe perguntou a ela onde
estava o seu agasalho, pois fazia muito frio, ainda era cedo e o sol não estava
demonstrando muita vontade de se expor naquele dia; e a única resposta que
obteve foi: “eu não tenho blusa de frio,
Dona Bárbara”.
Enquanto eu ouvia as palavras
saltarem da boca da minha Mãe, eu já podia imaginar o desfecho da história e a
cada palavra pronunciada meu coração palpitava mais forte; surgiu em mim uma
vontade súbita de chorar... Era como se eu tivesse uma dúzia de nós atarraxando
a minha garganta.
Não vou negar que estou emocionado
aqui, agora, e também não vou negar que é tamanha a minha dificuldade pra
colocar essas palavras no papel. Há dias isso aconteceu, e há dias eu venho
tentando escrever o que para alguns, são apenas palavras, mas para mim isso foi
muito mais do que uma lição suficiente pra uma vida inteira.
“eu não tenho blusa de frio, Dona Bárbara”.
Honestamente, ouvir isso fez parecer
como se o mundo tivesse acabado pra mim... Nesse instante, eu me senti vazio,
como se eu fosse a pior pessoa do mundo. Me senti inútil, triste, fraco,
egoísta... Não que eu não pudesse fazer nada para ajudar, porque afinal, a
partir daquele instante eu já iria separar as blusas e calças para a minha Mãe fazer
a doação que ela queria fazer.
Eu digo que me senti como seu eu
fosse a pior pessoa do mundo, por todas as vezes em que eu passei perto dessa
mesma criança na rua da minha casa e sequer quis observar se ela estava
vestida, calçada ou com fome... Me senti egoísta por todas as vezes em que eu
olhei à minha volta e tudo que eu pude ver foram as minhas ambições, sem me
importar com as pessoas ao meu redor. Me senti triste, por todas as vezes em
que eu estive focado apenas no futuro distante e por todas as vezes em que eu fechei
os meus olhos pra não ver o que acontecia no presente bem à minha frente...
Por muitas vezes eu fiz caridade;
participei de campanhas arrecadando alimentos e agasalhos, visitei asilos,
crianças carentes... Por vezes fiz o bem ao próximo; Eu sei que eu fiz a minha
parte, mas ainda assim, mesmo diante de tudo isso eu me senti inútil. Afinal, de
que adianta carregar o mundo nas costas para ajudar um “desconhecido”, enquanto um vizinho bate à porta da minha casa à
procura de um pedaço de pão pra matar uma fome implacável? E eu sequer pude notar
a situação em que este se encontrava.
Há tempos eu não me sentia da
forma como eu me sinto agora... Esse fato mexeu muito comigo e me fez pensar de
uma forma diferente. Diante disso eu me emocionei, me arrependi, agradeci e
agradeço a DEUS por tudo que tenho, principalmente pela minha Mãe, que no ápice
da emoção se desfez de seu agasalho naquele momento, pra não deixar que aquela
criança fosse pra escola com frio. Minha Mãe, que dos anjos que existem nesse
mundo, eu sei que Ela é o que guarda a minha vida... Que veio até mim no momento
em que eu, inconscientemente, mais precisava de alguém para me abrir os olhos e
me fazer enxergar que enquanto eu reclamo das menores dificuldades, outras pessoas
sofrem bem à minha frente, com frio, fome, sozinhas, doentes. Ela, que veio pra
me fazer lembrar quem sou eu, de onde eu venho e que me fez ver novamente que até
mesmo um sorriso bobo pode mudar completamente o rumo do dia de alguém.
Que possamos levar daqui em
diante a lição de viver como pessoas mais observadoras ao que acontece à nossa
volta.
Talvez as coisas que nós sempre
buscamos estão bem diante de nossos olhos... Só nos basta querer enxergar.
Espero que gostem!
Saiba que pelo menos uma pessoa desconhecida partilhou dessa emoção e irei olhar pelas pessoas ao redor. Obrigada pela mensagem.
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